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Lucia Camargo entrevistada no livro Conversa de Mulher 2

“Com o tempo os horizontes vão se abrindo” diz Lucia Camargo

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Curitiba, 19 de Agosto de de 1989

 

LUCIA CAMARGO; Atua na área cultural desde 1964. Dinâmica, inovadora e extremamente competente, Lucia, atualmente, é a Secretária Municipal da Cultura da Fundação Cultural de Curitiba, onde dedica integralmente seu tempo às 49 unidades que Fundação abrange. Esta é Lucia, Sra. do jornalista Francisco Camargo. 

 

Izza – Como você iniciou a sua atuação na área cultural? 

Lucia – Foi em 1964, quando eu estudava na Universidade. Resolvemos fazer um espetáculo para a Liga das Senhoras Católicas e, na época, eu presidia o Álamo – que era uma ala jovem da Liga – a convite da dona Ilda Leal, então presidente. Fizemos um espetáculo muito interessante porque várias pessoas participaram deste grupo; posteriormente, por questões políticas, nos separamos.

Izza – Qual era o espetáculo?

Lucia – O espetáculo chamava-se “O Nosso Show” e participaram até artistas plásticos, como o Humberto Spíndola, Juarez Machado, Cleto de Assis, João Ozório Brzezinski, Calderari. Eles geralmente nos ajudavam a fazer o cenário. O paquito que hoje trabalha conosco, fazia a luz.

Izza – No que consistia o espetáculo?

Lucia – O espetáculo era pretensioso, mas foi um sucesso porque era variado: tinha teatro, dançam etc. O primeiro contou com a presença do Lápis e da Rosemary (que hoje está cantando com o Luiz Carlos Vinhas). Aconteceu em junho, na Reitoria, e o interessante é que os jornais não deram cobertura; o falecido Arnaldo Fontana, que hoje dá o nome para a Sala da Cinemateca, falava um trecho do Hamllet em inglês arcaico tal como foi escrito em Shakespeariano.

Com o êxito alcançado as senhoras nos pediram que fizéssemos mais um, para arrecadar mais dinheiro; fizemos o segundo em agosto a assim foi indo. Em 66 realizamos a primeira Noite da Poesia Paranaense, onde reunimos todos os poetas que na época faziam e declamavam poesias; dezoito poetas participaram, entre eles, o Paulo Leminski.

Izza – Como jornalista, qual foi seu primeiro trabalho?

Lucia – Quando saí da escola, comecei a trabalhar no Jornal “O Estado do Paraná” e até me disseram que eu teria sido a primeira mulher contratada efetivamente! (Não sei se é certo ou não). Lá fiquei, cobrindo esta parte cultural e, quando saí do jornal, o Enio Marques Ferreira chamou-me para que eu fizesse a cobertura Internacional de Folclore; então fiquei no Departamento de Cultura. Comecei a cobrir os cursos internacionais de música, onde eu aprendi realmente tudo relativo à área.

Izza – Qual foi o próximo passo?

Lucia – Em 1971, o Helio Pulgieli (então superintendente do teatro Guaíra) convidou-me para ser Coordenadora do Curso de Teatro; depois, houve uma vaga no Conselho do Teatro, passei a ser conselheira até 1979 e continuava cobrindo a parte cultural pela Diretoria de Assuntos Culturais. Quando transformou-se em Secretaria, eu continuei porque, à esta altura, eu tinha uma nomeação de professora primária. Fiquei trabalhando como jornalista e como professora até 1983. Aí, houve um concurso, eu fui readaptada e tudo se acertou. Andei também pelo Museu de Imagem e do Som como Coordenadora da área de Imagem, mas fiquei pouco tempo.

Izza – Como você chegou até a Fundação Cultural?

Lucia – Vim em 1979 para ser assessora para projetos especiais da então Diretoria da Fundação Cultural, a convite do Jaime Lerner, do Mercer, do Viaro, dos diretores, e do Ernani Buckmann e indicada pelo Aramis. Fiquei fazendo o projeto “Parceria”, que acredito ter dado certo porque muitos querem que o façamos novamente. Em 1980, o Ernani saiu e fui convidada para ser Diretora Executiva, cargo que desempenhei até 1983. Saí para viajar e fiquei seis meses fora, na Europa. Quando retomei, a Funarte com quem eu já tinha trabalhado convidou-me para ativar a escritório aqui. Fiquei até 1987 e, nesta Fundação de Arte do Ministério da Cultura, atuei em vários setores.

Izza – Você não acha que Curitiba dá muita importância à Cultura?

Lucia – Curitiba é um dos melhores lugares para se fazer música erudita, talvez porque não tenhamos críticos. Pelas suas características provincianas (que eu penso serem paroquiais), Curitiba tem uma coisa interessante que é, justamente, você ter a possibilidade de fazer música e poder contar com o apoio do público. (Na área de música a gente joga a possibilidade de público a 50 ou 80%). Na música precisamos da integração com os estrangeiros – principalmente os europeus – que trouxeram seus instrumentos e suas danças.

Em Curitiba, acontece uma erudita e outras em que temos teatro e dança. Por sinal, temos um excelente Ballet que completa vinte anos. Aqui acontecem muitas coisas que não acontecem em outros lugares do País, mas o incrível, é que as coisas não atravessam fronteiras e ficam ”presas” no País. Talvez ainda não tenha chegado o momento de exportar. Hoje tudo: uma consciência mais desenvolvida e um melhor profissionalismo, apesar de não termos uma rádio ou televisão que use nossos atores. De qualquer forma, estamos vendo que há uma consciência profissional maior. Com o tempo os horizontes vão se abrindo.

Izza – Você não acha que existe pouca divulgação dos eventos?

Lucia – Acho que existe pouca divulgação interestadual. Neste ponto, é muito difícil furar o bloqueio Rio/São Paulo. Existe um desconhecimento total do Brasil. Na Funarte, nós sempre dizíamos que ela não era somente o conhecimento que as pessoas têm, entre a rua Araújo Porto Alegre e a Avenida Rio Branco. O Brasil é um ”pouquinho” maior que isso! Não sei se pelo fato do interior de nosso Estado ser extenso sempre tivemos esse grande conhecimento.

Em São Paulo é difícil entrar, mas é preciso acontecer no Rio de Janeiro. Temos que notar também que, em São Paulo, a mídia impressa tem seu valor como no Rio. Se sair na Folha ou JB já é sucesso por suas tradições na área cultural. Aqui, a oferta é muito grande! Às vezes acontecem 5 ou 6 exposições na mesma noite; temos o Teatro Guaíra, o Guairinha, o Solar do Barão, uma loucura! Além do mais, temos espetáculos que contam com público específico, mais direcionado. Por exemplo, em música erudita, no Paiol, geralmente comparecem mais de 180 pessoas. É muito interessante ver esse trabalho. Na segunda, terça e quarta, Teatro na quinta, música erudita e na sexta, sábado e domingo, música popular.

Izza – O que você pensa sobre a falta de críticos em Curitiba?

Lucia – Primeiramente, é uma característica própria, de uma cidade onde todos se conhecem. Como já disse, é uma coisa paroquial; então as críticas são evitadas. Eu gostaria muito que houvessem críticos, perincipalmente na área de teatro. Inclusive, o secretário de Cultura do Estado foi crítico de teatro, mas abandonou. Alguns fazem cinema. O Eduardo Virmond que fazia música e artes plásticas não faz mais. Quando queremos uma crítica mais abalizada temos que trazer alguém “de fora”. Os jornais, apesar de abrirem espaço, não incentivam de maneira adequada. Na área da dança a Elo Teixeira escreveu um pouco; também a Elizabeth Luz (que por sinal era ótima). A reclamação é muito grande sobre a crítica teatral no Brasil.

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