Curitiba 27 de Janeiro de 1990
RUTH JENSEN; é uma mulher vibrante e de incrível bom astral. Gosta de movimento, ginástica, de manter-se em forma. Ruth é proprietária da KNC, Acessórios e Bijouterias, desenvolvendo um trabalho artesanal, com grande criatividade, há quase três anos. Hoje, em nossa conversa, ela nos conta como começou e como desenvolve o trabalho. Esta é Ruth, Sra. Milton Jansen.
Izza – O que o trabalho representa para você?
Ruth – Sempre digo que tenho mãos indócis, por isso nunca pude ficar sem trabalhar. Há anos, comecei na Viação com meu marido. Eu fazia relações públicas e um pouco de trabalho burocrático. Adorava. Mais tarde, o Milton se aposentou por motivo de saúde e vendemos a empresa. Aproveitei, então, para curtir por um tempo a caça e pesca no Mato Grosso, que me fascinava. Depois, tudo ficou muito monótono, me cansava ficar em casa assistindo televisão, sem um objetivo maior. Comecei então a idealizar riscos para penaux, que depois bordava com lã. O trabalho era intenso e demorado. Imagine, que eu levava três meses bordando, num trabalho de quatorze horas diárias. Era muito longo e cansativo e senti que não era exatamente aquilo que eu queria. Notei que meus desenhos e bordados sempre puxavam para o estilo inca, asteca. Decidi então, passar aquilo para o tricô, mas senti que ainda não havia atingido o meu objetivo. Finalmente quando fui para Londrina visitar familiares, minha filha me telefonou contando que havia comprado uma pele e feito uma bolsa. Na volta me empolguei com o trabalho, compramos couro e começamos a criar. Me lembro que desmanchei algumas bijuterias minhas, recriei as formas e os resultados foram surpreendentes. Me apaixonei pelo trabalho e entrava madrugada adentro não sentindo o tempo passar. Muitas amigas me incentivavam e eu vendia tudo o que produzia. Aí nasceu a K.N.C.
Izza – Qual o foi o passo seguinte?
Ruth – Claro que com a produção aumentando eu teria que comprar material em maior quantidade, então comecei a viajar para São Paulo onde encontrava mais variedade em maior escala. O couro eu compro aqui. O que me incentivou foi o fato de mulheres acostumadas a usar jóias mas que não podiam devido à época, aceitaram bem o couro, por ser um material nobre. Como houve muita aceitação, os pedidos, principalmente de boutiques gabaritadas, foram crescendo e eu fui me tomando conhecida; automaticamente o nosso trabalho foi sendo reconhecido e admirado por um número maior de pessoas. Digo nosso, porque minha filha Cristine ajuda bastante e participa de todo processo.
Izza – Você fez cursos ou aprendeu as técnicas com alguém?
Ruth – Sempre afirmo que sou auto-didata. Nunca fiz curso e tenho a impressão que o dom nasce com a pessoa. Outro dia encontrei a primeira alça de couro que fiz e tive vontade de rir. A gente vai aprendendo, errando, e com o tempo e a prática, chegamos quase à perfeição, além do mais, o couro é perene, não sai de moda e oferece muitas opções. Quem não aprecia usar um bonito cinto ou um colete? Às vezes faço os conjuntos combinando com gargantilhas, que são o meu carro chefe (pulseiras, brincos, etc.)
Izza: Nesse ritmo quantas peças você consegue fazer numa semana?
Ruth – Por exemplo: conjunto de gargantilha completo, num dia que corra tudo perfeitamente, consigo fazer de dez a quinze. O astral interior tem que estar em harmonia com tudo o mais. Veja bem, a característica destas peças é o fato de serem feitas manualmente e não em série, eu dependo das minhas mãos e da minha criatividade.
Izza – Às vezes as dificuldades na aquisição do material não prejudicam seu trabalho?
Ruth – No ano passado, eu tive que mudar certos modelos por falta de peças. Haviam greves, falta de alguns acessórios. Neste caso a gente tem que ser versátil e até existe o lado bom, pois a falta é produtiva na medida em que nos faz pensar em outros modelos. Até chegamos a substituir uma coisa ou outra, às vezes, por peças ainda mais bonitas. Este fato me obrigou a começar a fabricar o que antes eu comprava e hoje eu mesmo faço o miolo do arco inquebrável, os braceletes, etc.
Izza – Em relação ao lucro, compensa?
Ruth – O lucro, nos dias de hoje, ainda é pequeno. A minha satisfação talvez seja mais pelo lado artístico do que pelo financeiro. Aqui em casa, a minha família até acha engraçado o fato de eu ter pena de me separar de minha criação. Sei que é anticomercial. Ao mesmo tempo quero vender, me realizar comercialmente, me apego às peças porque as faço com amor. Em virtude da crise, não podemos cobrar o valor real de uma criação. Temos que amenizar de alguma forma. Talvez esteja aí o segredo de nosso sucesso.
Izza – E a concorrência?
Ruth – Apareceram muitas atravessadoras e alguns imitadores, mais isso não me preocupa porque cheguei a ver o trabalho e, realmente não era em nada parecido com o meu. Faltou aquele ”tcham’ ‘. Parecido não é igual. Você sabe. Não me incomoda, continuo com minha criatividade.
Izza – Você já pensou em exportar?
Ruth – Penso nisso paro o futuro. Já vendi peças que foram para a Bolívia, Paraguai, Estados Unidos, Panamá e até para a Rússia. Quanto a exportar, eu já tive propostas para mandar para os Estados Unidos mas lá eles querem peças muito iguais e, como faço tudo artesanalmente não posso garantir que todas as peças saiam idênticas. Além do mais este trabalho depende muito do nosso estado de espírito e é lógico, que tenho dias de mau-humor como todas as pessoas têm e outros que são extremamente proveitosos, onde consigo produzir em grande escala.
Izza- Você pretende ampliar a sua empresa?
Ruth – Já pensei nisso, mas acho que para aumentar a produção, eu teria que ensinar a arte para outras pessoas e tenho certeza que criatividade a gente não ensina, vem de cada um. E creio que assim eu perderia a minha marca, minha característica. É tudo muito artesanal, por isso é diferente. Não tenho muitos planos relativos à ampliação da K.N.C, e um deles é realmente continuar criando. As coisas se resolvem por si só, quando a gente acredita e se dedica com amor. Por enquanto, me sinto realizada.
lzza – Este trabalho consome seu tempo integral?
Ruth – Tenho uma norma: quando o relógio marca quatro horas da tarde, por mais encomendas que eu tenha, largo tudo. Vou me produzir para ir à ginástica. É nesta hora que eu consigo me relaxar, me sentir mais disposta e manter o meu equilíbrio físico e mental.
Izza – De onde você tira toda essa energia?
Ruth – Sou taurina, gosto de viver no meio dos jovens. Agora entendo por que meu pai convivia sempre entre os mais jovens e era um fã ardoroso das mulheres. Ele me ensinou que a feminilidade é fantástica e o quanto é bom ser mulher.
Izza – Para finalizarmos, qual é a sua filosofia de vida?
Ruth – É não deixar nunca de ter fé e vontade de realizar as coisas. Viva e deixe as pessoas viverem. Faça aquilo que você gosta. Existem muitas frases feitas sobre isso, mas acho que nunca devemos nos deixar abater porque, se hoje o tempo é ruim, amanhã com certeza o céu estará azul. Mesmo depois de eu ter passado por difíceis experiências a vida tornou-se boa novamente. Viver vale a pena!