Curitiba, 9 de outubro de 1988
VACILA JULIO MERLIN – E uma das pessoas que sempre trabalharam em prol dos menos favorecidos, porém em silêncio. Com uma capacidade enorme de trabalho e liderança, Vacila foi presidente da Associação das Senhoras de Rotarianos, cargo esse que encerrou recentemente, com destaque. Coordenadora do 12? Encontro da Amizade, há muito se dedica a várias causas, que fazem de seu cotidiano uma luta constante. Esta é Vacila, Sra. Diny Merlin.
IZZA – Vacila, você tem se destacado muito na Associação de Senhoras de Rotarianos. Conte-nos sobre isso.
VACILA – Lá, tivemos um ano como vice-presidente e no outro como presidente. O ano da gestão é movimentadíssimo, com muito trabalho. Poderia ser bem tranquilo, mas isso depende de cada uma. Não é o meu caso, porque quando assumo alguma coisa vou profundamente até às raízes para ver o que posso tirar de bom, da essência, para saber o que pode ser feito e que seja importante dentro do que a entidade se propõe.
IZZA – Qual seria exatamente o trabalho dessa associação?
VACILA – Atender às crianças carentes. O objetivo da entidade é que as crianças saiam tendo condições de ser alguém amanhã. Que saiam com a cabecinha bem formada, com uma visão mais ampla do que é o mundo, e saibam se conduzir futuramente. O CEMIC é novo por isso por enquanto só temos visto resultados mais imediatos. O Centro de Estudos do Menor e Integração a Comunidade aceita crianças de famílias menos favorecidas nas quais a mãe tenha que trabalhar. Não é uma creche: eles vão, almoçam, estudam, tem recreação, tomam lanche e à tarde as mães vão buscá-los. Este é o principal trabalho da associação.
IZZA – A entrada das senhoras do Rotary é opcional?
VACILA – No momento em que o marido é convidado a clube para ser um rotariano, automaticamente a esposa toma-se senhora de rotariano e pertence à associação. Todas as segundas-feiras trabalhamos. Ali se faz tricô, crochê, pintura, costura e tudo o que auxilie as pessoas que necessitem. No final, ou durante a gestão de cada uma, fazemos as doações. Sempre estamos atendendo pedidos, mas no final doamos o trabalho que foi executado durante o ano todo; ou distribuímos para as entidades que mais precisem. É difícil hoje em dia quem não esteja precisando. A carência é total em todos os aspectos.Uma das entidades que admiro é a São João Batista, porque os que a procuram são transitórios: eles vão ao albergue, passam a noite e no dia seguinte saem com o banho tomado, alimentados e agasalhados. Auxiliamos, levando cobertores, agasalhos, etc. Desde que a associação nasceu, o trabalho sempre foi esse. Tenho 21 anos lá, por isso tenho todo esse carinho. E o que é mais importante, sempre tivemos sucesso em nossas promoções. Já fizemos bingos de artes, e as pessoas cooperam tanto que pudemos realizar dois bingos em vez de um. Foi grande a resposta que tivemos.
IZZA – Você é bastante idealista, não é?
VACILA – Sou. Tive uma boutique na Galeria Batei durante dez anos. Um dia estava só, e me ligaram da associação para que eu desse uma chegada lá. Bem, nesses dez anos eu tinha sido uma ausente presente, porque fazia desfiles em prol da associação e participava quando solicitada. Enfim nunca havia me ausentado totalmente. Bem, como estava contando, quando lá cheguei, bateram palmas, olhei para trás mas não havia mais ninguém depois de mim. Foi muito interessante: estava o conselho reunido. Assumi, fechei minha boutique, porque é muito difícil conciliar duas coisas importantes. Uma entidade onde se trabalha muito e em silêncio. Veja a campanha anti-pólio de vacinação é uma doação total do Rotary. Não é divulgada, mas o Rotary é internacional, fazem maravilhas, mas sempre em silêncio. Eles são muito reservados, e o homem rotariano só entra quando é convidado. Jamais poderá dizer; “Eu quero ser”.
Só ingressa a convite. Acho que em tudo o que você faz, está cumprindo com um dever social e humanitário. O ser humano é muito falho, então deveria espontaneamente fazer seu benefício, dar o seu quinhão em prol da humanidade, mas de repente ele só dá, se tem oportunidade, porque na realidade os oportunistas pouco fazem. Aí entra o rotariano que se conscientiza pelo fato de ter sido convidado. São líderes da comunidade, de setores de trabalho e geralmente há uma seleção de classificação. Para cada setor de trabalho é convidada uma pessoa. Então, cada clube tem uma pessoa que pertence a cada tipo de função. São líderes e, por serem assim, já têm certo destaque. Então o Rotary é um Clube de Serviço onde só líderes participam.
É um esquema tão bonito, tão bem montado que qualquer pessoa que conheça um pouquinho se empolga muito. A proposta do Rotary Internacional é terminar com a poliomielite e todas as doenças que afetem e marquem a criança. Se Deus quiser, dentro de cinco anos não haverá mais o problema da poliomielite no mundo, e isso é um trabalho magnífico. E uma organização fabulosa e as gestões não ultrapassam um ano, porque dentro, sem cansar os outros temos a capacidade de fazermos um bom trabalho. A dedicação é muita. Quando meu marido era presidente, está- vamos construindo essa casa e tivemos que parar porque que, com as atividades dele mais as do Rotary, não sobrava tempo. Em resumo, só iniciamos as obras no ano seguinte. Porém, o Rotary e a Associação de Senhoras de rotaryanos não têm nada a ver. Nós somos esposas e trabalhamos ao lado de nossos maridos, porém se formos rotarianas teríamos que ter um companheiro que não fosse, para que possamos ajudar. Como meu marido é, fica óbvio que, numa campanha nas coisas de que ele precise em seu clube, poderá contar comigo. Acho que a esposa ajudando, dando força é importantíssimo. A esposa tem uma missão muito bonita, estimulando ou fazendo um trabalho que realize dentro de uma coisa que é válida. Temos também as colaboradoras, mas pelo estatuto elas não podem participar da diretoria. Não sei por que você escolheu a mim para esta entrevista.
IZZA – Porque acho incrível esse trabalho que vocês fazem. O clube de serviço em minha opinião, desenvolve um trabalho nobre porque são pessoas que se dedicam por idealismo, altruísmo. Acho que, hoje em dia, já vivemos numa época em que quase tudo gira em tomo de dinheiro. Isso realmente merece destaque. Esse desprendimento é nobre.
IZZA – O que você pensa sobre isso?
VACILA – Tudo o que eu faço, tento fazer da melhor forma possível. Me dou totalmente e quero que as coisas se realizem sem pensar se tenho que investir ou não. Infelizmente, nem sempre conseguimos chegar lá, porque as tarefas envolvem muitas outras coisas. Por exemplo, temos uma biblioteca no Jardim das Américas que é um trabalho fantástico. Nós a fizemos e passamos para o Estado, mas agora estamos com a necessidade de ampliação porque a freqüência é grande, e estamos com o espaço físico limitado, porque com a dificuldade atual de compra de livros, os universitários do Centro Politécnico consultam nossos livros. Agora meu sonho é ver realizado o aumento e estamos lutando por isso. Se não tivermos um ideal e sonharmos, nada se faz.
IZZA – Você é uma lutadora, não é?
VACILA – Sempre fui muito batalhadora, desde cedo. Se você me perguntar se eu gosto de cozinha eu respondo que sim. Vou e adoro. De jardinagem também gosto, pois nunca me limitei a uma coisa só. A minha paixão, por exemplo, é o comércio e é por isso que já trabalhei nele. Mesmo que eu diga que quero parar, sinto que não dá. A minha cabeça sempre está agilizando alguma coisa. A mulher antigamente era preparada para o casamento, hoje ela deve estar apta para assumir o casamento e a família. Ela é o esteio do lar ao lado do marido, mas ao mesmo tempo para maior realização, ela não pode se limitar ao serviço da casa.
IZZA – Mas você não acha que com toda essa liberação, as mulheres, às vezes, exageram?
VACILA – Acho que nesse caso é um pouco de falta de consciência do valor da mulher. Tanto o homem como a mulher têm deveres dentro de casa, porque um lar sem um dos dois nunca chega a ser realmente um lar. Claro, a mulher tem a necessidade de sair, e pode fazer isso mas com medida. Sentir-se útil, porém sem afetar a outra parte que é a família. Veja bem, é válido a mulher auxiliar, porque existem famílias de quatro ou cinco filhos, e se somente o homem trabalhar, fica pesado. A mulher foi educada até agora para o casamento, então ela aprende a ser dona de casa, economia doméstica. Incute-se desde que ela nasce, que ela tem que ser criada para ser mãe, dona de casa. E não é bem assim: ela tem que participar porque a vida é uma eterna evolução, o homem evoluiu. Existe também o fato de que o homem, tendo atividade fora vai crescendo e a mulher estaciona. Resultado: falta de diálogo entre o casal. Por isso digo, a liberação é excelente, desde que seja na medida certa.
IZZA – Quais são seus planos para o futuro agora que você termina sua gestão no Rotary?
VACILA – Tenho mil planos, porém não bem definidos, por isso só posso contar mais adiante. Trabalhei 23 anos e agora sou presidente do Conselho. A minha gestão foi até 30 de junho e o ano Rotaryano, mas como tivemos o encontro nacional, continuei como coordenadora do encontro, o 12e Encontro da Amizade. Foi lindo, recebo até hoje telegramas, cartas e telefonemas cumprimentando pelo evento. O interessante é que em todo o Brasil, o trabalho é mais ou menos o mesmo e nem todos os países têm atividades femininas. Elas geralmente só vão ao Rotary nas reuniões festivas, posses, visitas, etc. Nestes encontros que acontecem de dois em dois anos, é dada a comenda Rosa de Prata, oferecida à entidade que mais se destacou pelo trabalho.
Quem recebeu este ano foi Resende, com um trabalho maravilhoso e dinâmico. Há dois anos atrás, ganhamos devido à Biblioteca Pública que foi fundada e pelo Pavilhão da APAE. Deixa de ser trabalho de casulo para ser algo maior. A união faz a força. No momento sou também membro do Conselho Infanto-Juvenil, mas estive um tanto afastada porque, quando abrangemos muitos setores, não se consegue realizar muito. Neste período paralelo ao trabalho da Associação, eu tive a coordenação de uma conferência distrital, do Paraná todo, depois tive uma assembléia distrital. Foi também um trabalho muito grandioso, abrangeu todo o Distrito e culminou com o Encontro Nacional, então por mais que eu quisesse fazer não conseguiria. Fui agraciada também com a comenda Boca Rouge, que me deixou bastante feliz. Eu sempre sou solicitada, procuro atender, porém mais em silêncio. Gosto de ajudar, mas não gosto de aparecer, a não ser que seja para o bem de alguma coisa.
IZZA – Neste ano você deve ter tido momentos magníficos, expressivos. Conte-nos sobre isso.
VACILA – Um momento que me marcou foi quando fui convidada para ser coordenadora do 12ª Encontro da Amizade porque é uma responsabilidade muito grande, e foi expressivo pela confiança que a coordenadora internacional depositou em mim. Também a dedicação das companheiras, principalmente as do meu clube, que me deram uma demonstração de lealdade, me surpreendeu. Foram provas de depreendimento de pessoas que eu não esperava. Às vezes exercemos alguma atividade que não nos dá a chance de avaliarmos as verdadeiras amigas, mas quando estamos numa luta e sentimos que as pessoas estão ao nosso lado, batalhando pelos mesmos ideais. Isso sim é compensador e gratificante. Seria ótimo se todo o ser humano tivesse a oportunidade de conhecer as amizades puras, lapidadas. Por isso, sou entusiasta, esposa de rotariano e batalhadora pela causa que é uma causa muito bonita.
IZZA – E para finalizarmos este bate papo?
VACILA – Tenho que lhe agradecer. Estou surpresa por ter sido convidada a fazer esta entrevista. Graças a Deus sempre tive apoio das pessoas e da imprensa e nosso trabalho, em momentos que eu necessitei e estamos aí para qualquer coisa que se faça necessária. Estou sempre disposta a trabalhar pelo bem dos menos favorecidos.