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“A MINHA META É MOSTRAR O VALOR DAS PEQUENAS COISAS” afirma Rosil Lago

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Curitiba, 22 de dezembro de 1988

IZZA – Rosil, vamos falar da Clínica Lago. Há quanto tempo ela existe?

ROSIL – A ideia de abrir a clínica já existia há dez anos. Sempre tentei fazer a cabeça do Ismael quanto ao assunto. Eu trabalhei com ele no consultório desde o início, durante vinte e cinco anos. Eu fazia de tudo: era enfermeira, secretária, tudo o que precisasse, tanto interna como externamente. Sempre gostei de acompanhá-lo. Como ele sempre tratava com obesidade, comecei a incentivá-lo, porque constantemente tive em mente sugerir que ele fizesse alguma coisa no ramo em que já estava atuando.

E, quando dei a ideia de fazermos uma clínica aqui na chácara, ele até achou loucura de minha parte, mas devagarinho foi aceitando e prontamente marquei a data da inauguração para o final do ano. Como ainda era princípio do ano, daria tempo para as devidas reformas. Abrimos sem propaganda nenhuma, sem promoção. Confesso, que no princípio tive medo, porque para mim mais parecia uma aventura, mas deu certo. Inauguramos no mês de novembro e em janeiro a lotação já estava completa, somente com clientes e amigos. A partir daí a procura tem sido bastante boa, também porque somos pequenos. Não queremos competir com as grandes clínicas.

IZZA – Você não acha que pelo fato da Clínica ser pequena, atrai pelo tratamento mais direcionado, dedicado a cada um?

ROSIL – Não pretendemos aumentar porque a nossa finalidade aqui é preservar a individualidade do paciente. Ele é um amigo, uma pessoa única e se crescermos mais, automaticamente essa característica diminuirá. Eu já tive um caso de uma moça que havia sido internada numa clínica do Rio de Janeiro, excelente, e depois nos descobriu por intermédio de uma amiga que já havia estado aqui. Eu lhe perguntei por quê, e ela me respondeu que se sentia muito sozinha lá, e que se quisesse passar o dia inteiro no quarto, ninguém a procurava. Ela era apenas um número, ao passo que aqui, se sentia num ambiente familiar, entrosada no grupo que, por ser menor, permite a participação e união de todos.

IZZA – Vocês obedecem a uma programação?

ROSIL – Temos uma programação intensa, porque quando a gente tira o alimento, a fonte de prazer que é a comida, temos que substituí-la. Veja bem, a gente não convida ninguém a nossa casa sem oferecer uma bebida, um doce, uma cerveja, etc. então as pessoas estão acostumadas a serem recebidas com alguma coisa no gênero, e aqui temos que retirar tudo isso e quando trocamos a alimentação imediatamente tentamos substituir por outras coisas; carinho e distração. Aliamos ao regime alimentar (uma dieta de baixa caloria) bastante atividade física, pois temos uma equipe de fisioterapeutas, massagistas, professores de educação física, Yoga, enfermeiras capacitadas, psicólogos, atendimento médico, e tudo isso para que o paciente esteja sempre cercado de atividades de lazer que é o que mais procuramos acrescentar ao tratamento. À noite, fazemos bingos, pequenas serestas, jogamos cartas, procuramos completar o dia dos pacientes que mesmo por si próprios já vão se entrosando, inventando brincadeiras.

Hoje por exemplo, fizemos uma caminhada de cinco ou seis kms. Chegamos, tomamos café, e em seguida nos dirigimos a ginástica, com aparelhos, para diversas finalidades. Depois veio o professor de educação física que acompanha inclusive em partidas de vôlei, gincana, atividades ao ar livre, ginástica aeróbica adequada a cada caso, porque é uma atividade bastante puxada, dada somente para os que têm condições de acompanhar. Quando o tempo permite, damos atividades na piscina. Na parte da tarde, essas atividades são mais suaves, massagem relaxante, estéticas, forno de bier, aparelhos eletrônicos, sauna, seca, úmida, ducha escocesa, turbilhão etc. Temos também reuniões terapêuticas, tipo terapia de grupo e palestras que são dadas à tarde ou à noite para orientação do paciente e conscientização de continuidade do tratamento lá fora. Também dispomos do Alfatrom, um aparelho que leva ao relaxamento, quando o paciente atinge alfa. Aqui é orientado conforme seu caso, através de fita gravada para condicionar a mente. Através desse aparelho, o paciente se prepara para enfrentar o mundo lá fora quando ele sair da Clínica.

IZZA – As atividades são obrigatórias?

ROSIL – Não, nada aqui é obrigatório. A gente incentiva para que eles sintam estímulo para fazer porque, normalmente, as pessoas que estão aqui, vieram por obesidade e é importante para o tratamento que elas acompanhem as atividades.

IZZA – A Clínica do Lago é especificamente para problemas de obesidade?

ROSIL – Não, para stress, esgotamento físico. Neste caso, elas acompanham à medida que queiram. Recomendamos, nos diversos casos, o mínimo de uma semana de internamento porque temos diversas atividades intercaladas, uma programação que inclui inclusive os domingos. Neste dia temos horário para visitas e uma celebração religiosa, realizada por um diácono. O restante é como os outros dias. Nós temos também um cuidado para que as pessoas sintam aqui um pouco de reencontrar-se com si mesmos, com a natureza e com Deus. Fazemos um apostolado no sentido de fazer as pessoas perceberem o valor das pequenas coisas. Eu entrego nos quartos à noite, uma mensagem de fé, otimismo, um presentinho, porque temos que substituir muitas coisas.

Veja, as pessoas normalmente acham que comer, beber, jantar fora é um lazer, principalmente para nós curitibanos que não temos muito o que fazer à noite, a não ser sair para almoçar, jantar, reuniões, casa de amigos, então tentamos substituir isso aqui e mostrar o valor da verdadeira amizade, um bate-papo gostoso, etc. Temos um músico terapeuta que vem, conversa, canta numa atividade muito apreciada porque todos gostam de deixar sair o seu lado artista. Cantar em grupo, nós deixamos para a noite. Até nossos funcionários já pegaram esse jeitinho e ajudam a transmitir o apoio para as pessoas. Tenho uma equipe ótima que nos ajuda a fazer tudo isso. O Ismael também dá palestras porque, como ele trabalha em encontro de jovens, casais, aqui também ele procura transmitir isso, portanto as pessoas vêm aqui e fazem uma reciclagem não só física como também espiritual. Acredito que isso nos diferencia de outras Clínicas. O nosso lema é carinho. Veja na porta dos quartos, aqui não existem números e sim, nomes: Felicidade, Bondade, Esperança e assim por diante.

IZZA – Quantas pessoas vocês podem receber na Clínica?

ROSIL – Temos quinze quartos, e a nossa capacidade é para trinta pessoas no máximo. Muitos nos procuram para passar o final de semana, mas não aceitamos, somente em casos esporádicos e especiais, porque essas pessoas não passam por todo este esquema que gostaríamos que elas sentissem. O tratamento de regime, somente no terceiro dia é que começa a surtir efeito, então não é aconselhável. O mínimo é de uma semana e dez dias é o ideal. E além disso é difícil termos vaga somente para o final de semana, porque os pacientes que já estão, não saem nos finais de semana uma vez que estão em tratamento. Tenho muitos clientes que vêm de seis em seis meses apenas para reciclagem, outros de fora, São Paulo até de Assunção. A nossa propaganda é de boca em boca, é a recomendação das pessoas que já experimentaram.

IZZA – Em uma semana é possível perder peso?

ROSIL – Tudo depende de quanto a pessoa tem a perder porque o organismo é um computador. Nos alimentamos e temos que gastar. Já tivemos casos de pessoas que perderam até um quilo por dia. A nossa média é de 400 a 500 gramas diárias. É razoável e mantém um equilibro. Queremos que a pessoa saia daqui renovada e com a cabeça feita, não importa se ela perdeu quatro ou cinco quilos, mas sim a meta que ela vai atingir e isso depende da pessoa. Um paciente que precisa perder 20 quilos logicamente não perderá no mesmo espaço de tempo do que uma outra que necessita perder 4 ou 5 quilos. É muito individual. As gorduras localizadas, ajudamos a eliminá-las com as atividades paralelas. Temos tratamento para isso, como celulite etc. Os recursos existem.

IZZA – E quanto à alimentação?

ROSIL – Temos dietas diversas, 700 a 800 calorias ao dia conforme o médico determinar. Ele está presente diariamente. Claro, tratamento para esgotamento mental, físico etc. requer outra dieta, mais rica em calorias e o que for necessário. No geral, nossa dieta inclui grelhados, acompanhados de verduras e frutas. Tenho um cardápio para quinze dias sem repetição. A noite fazemos lanche ou sopa.

IZZA – É você que organiza tudo isso?

ROSIL – Como trabalhei muitos anos com o Ismael, sempre acompanhando todo o tipo de tratamento, adquiri experiência, e ele me ajudou muito porque estamos dentro da especialidade dele. Equilibrei o cardápio para a combinação dos alimentos. Durante um ano cozinhei junto com as moças, todos os dias fazendo os pratos e ensinando a maneira de servir e apresentar e principalmente a quantidade indicada, até o tamanho do bife a ser cortado, a quantidade de iogurte etc., porque isso é essencial. Diariamente estou supervisionando.

IZZA – Pelo seu entusiasmo, isso aqui é a sua paixão, não é?

ROSIL – É a menina dos meus olhos. Quando entro aqui pela manhã, me esqueço do resto do mundo. E no meu trabalho me sinto à vontade. Acompanho todas as atividades e já pensei em morar aqui, talvez quando meus filhos casarem. Tenho três filhos, e por enquanto acho importante morar na cidade. O Fabiano tem 22 anos e passou agora para o quarto ano de medicina. A Danielle está com dezenove anos e está montando atualmente uma confecção. O Pedro tem dezesseis anos e curte muito a clínica. Todos estão encaminhados, mas atualmente, em idade de curtir os amigos, sair à noite, por isso acho que ainda não chegou a hora de mudarmos para cá.

IZZA – Em termos de gabarito, esta é uma das poucas existentes aqui no Paraná, não é?

ROSIL – E, igual a nossa acho que não tem, quanto ao estilo. Claro que existem clínicas maiores, vegetarianas, etc. De clínica para clínica o atendimento varia. Temos apartamentos com ar condicionado, telefone no quarto, hidromassagem, TV colorida e até lençol elétrico para cada cama. Aqui a natureza nos beneficiou, porque o lugar é muito bonito. Fizemos até um caminho para Cooper, e além disso, o canto dos passarinhos, a serenidade. O que Deus pôs aqui nos tornou cinco estrelas.

IZZA – Para você o seu trabalho é muito importante?

ROSIL – Eu sempre acompanhei o meu marido na profissão dele porque a vida de um médico é extremamente dedicada e sacrificada, então se eu não o acompanhasse no mesmo ramo, certamente teria outra atividade porque acho que a gente necessita ter objetivos. Não tenho tempo nem para ficar nervosa, porque os compromissos são inúmeros. Gosto, me realizei e me encontrei. Faço com amor. E um prazer. O que acho mais difícil é a parte administrativa. Temos que ser empresa e essa é a realização do meu ideal.

IZZA – Com todo esse trabalho sobra tempo para a vida social?

ROSIL – Nós sempre tivemos uma vida social muito intensa, muitos compromissos e procuramos equilibrar as coisas. Mesmo assim é difícil porque levantamos cedo e tento acompanhar diariamente. Às 10 horas da noite, já estou cansada, por isso não são todos os compromissos que podemos acompanhar, mas na medida do possível, compartilhamos. Temos muitos amigos e é um prazer estarmos com eles.

IZZA – Teus filhos sempre aceitaram essa atividade intensa dos pais?

ROSIL – Sim, porque eles já nasceram com o pai e a mãe trabalhando, por isso nos ajudam bastante, são compreensivos e nos acompanham na medida do possível.

IZZA – Você e o Ismael sempre se dedicaram aos problemas de obesidade especificamente?

ROSIL – Não, ele era obstetra e ginecologista e iniciou a fazer regime por causa da obstetrícia porque ficava preocupado quando as clientes engordavam demasiadamente na gravidez. Eu, sentindo a preocupação dele quanto ao fato, tentava ajudar orientando as clientes, porque essa história de comer por dois não é bem assim. Atualmente, porque não é necessário, e quando não havia o excesso, elas voltavam à forma mais facilmente depois do parto. Assim ele foi transformando a especialidade porque ele teve muito sucesso no regime que ele dava para as gestantes. Passaram-se os anos e os clientes foram aumentando então ele largou a obstetrícia e continuou a fazer ginecologia e regime e hoje a clientela maior dele é a de regime. Com os anos, ele foi se especializando cada vez mais com estudos, congressos e inclusive o meu filho já está se interessando em seguir o ramo do pai, talvez ele seja também endocrinologista.

IZZA – Você acha importante a mulher trabalhar?

ROSIL – Claro que sim, pois o trabalho é a melhor terapia. A mulher que trabalha tem a cabeça muito bem feita, mais equilibrada.

IZZA – Dá certo o casal trabalhar junto na mesma especialidade?

ROSIL – Para mim deu certo. Sei que em alguns casos não dá, principalmente se a mulher se sobressai mais, ou até mesmo o homem. Já observei. Hoje em dia os casais mais jovens são diferentes e, quando a mulher sai à luta para competir com o marido, isso prejudica o casamento. Nós nos harmonizamos e nos equilibramos porque estamos trabalhando na mesma atividade. Sei que a mulher é o equilíbrio da família e ela deve saber dosar, ser mãe, esposa e a profissional e conciliar isso tudo é difícil porque os problemas aumentam devido à época.

IZZA – O que você teria a dizer para finalizarmos?

ROSIL – Quero ter sempre como meta, mostrar o valor das pequenas coisas. Quanto à felicidade, ele não precisa ser procurada muito longe porque está dentro de cada um de nós. Me sinto realizada quando as pessoas se conscientizam disso. Aqui, a gente abre a janela, olha para a natureza e está frente a frente com Deus porque só não vê Deus quem não quer ver.

 

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