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“A PINTURA É A MINHA MANEIRA DE CONTINUAR SEMPRE VIVA” diz Claudia Guimaraes de Almeida

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Curitiba, 4 de dezembro de 1988

CLAUDIA GUIMARAES DE ALMEIDA. Nome expressivo da nova geração de artistas plásticos que vem se destacando continuamente pelo seu estilo próprio e desempenho admirável. Em suas telas, homenageia sempre a “mulher”, que confessa admirar por sua força e capacidade. Claudia está expondo no momento na Galeria Acaiaca, uma boa oportunidade para vermos os seus trabalhos porque somente vendo, poderemos avaliar o talento dessa jovem Sra. Roberto Beltrão de Almeida.

 

IZZA – Claudia, há quanto tempo você pinta?

CLAUDIA – Eu pinto desde pequena. Minha mãe fez educação artística na Faculdade e não sabia desenhar, e eu então a ajudava, desenhando e pintando. Mas comecei mesmo a pintar na Alfredo Andersen, e entrei na Belas Artes, sempre estudando para me aprimorar. Sou muito interessada desde pequena e sempre curti exposições e frequentei junto com minha mãe. É uma vontade tão grande que a gente sente de desenhar e de pintar que passa do limite racional. Me lembro que até vendo TV eu desenhava. Era uma coisa natural. Até cheguei a pensar que eu tinha dom para arquitetura. Fiz o vestibular, passei na prévia de desenho, mas não passei no resto porque sempre fui péssima em matemática e química. Então vi que não teria nada a ver e, quando entrei na Belas Artes, me encontrei.

IZZA – Você acha que esta preparação de escola, é essencial para o artista?

CLAUDIA – Acho, em termos de técnica, porque você tem a tua criatividade, a tua vontade de desenhar que está dentro de você. Mas eu acho que quanto mais recursos você conhecer para poder botar isso para fora, melhor, e a escola resume tudo. Eu poderia ter aulas de pintura com um ou outro, mas perderia muito tempo. A Faculdade é boa para quem quer aprender e quando saímos para pintar fora, conversávamos muito. Me lembro que o Calderari batia muito papo comigo, e com ele tive a oportunidade de aprender bastante. Ele vem até hoje em meu atelier e me ajuda a pesquisar. Sempre estou buscando coisas novas e quando acabo de fazer um quadro me supero tão rápido, que a vontade é de fazer e aprender muito mais. Isso é uma coisa de vivência.

IZZA – A sua família sempre a apoiou?

CLAUDIA – Estudei antes, na educação familiar e quando entrei na Belas Artes, comecei a participar e fui premiada. Assim a coisa começou a se definir mais. A gente precisa mostrar a vontade de fazer as coisas, daí as pessoas acreditam na gente. Hoje tenho um espaço que conquistei pela minha persistência. Muitas pessoas nos testam para ver até que ponto acreditamos em nosso trabalho. Hoje tenho o respeito de minha família e do Beto, meu marido, que me entende e me apoia bastante, principalmente quando estou no pique de uma exposição.

IZZA — Quando você fez a sua primeira individual?

CLAUDIA – Eu fiz a minha primeira individual antes de me formar, na “Bico de Pena”. Participei de salões fora de Curitiba, Guarapuava, Santa Catarina, etc., e comecei a participar bastante, confesso, para fazer curriculum. Como falei, fiz a minha individual antes de me formar porque acho que os melhores contatos que a gente têm estão na Belas Artes, todos os artistas, João Osório, Ivens Fontoura, Calderari, todos me ajudaram e eu precisava desses amigos. Pretendia fazer mais uma Faculdade porque eu já estava sentindo no final do ano que não havia muito mais o que fazer ali. O meu trabalho já estava
definido.

IZZA – Por que em teus trabalhos você faz uma referência especial à mulher?

CLAUDIA – Você, o meu trabalho é mais um desenho do que uma pintura. Eu mudo a cor, mas ela não é o elemento principal. Eu pinto a mulher porque ela para mim significa a força, e eu acho que atualmente ela é um ser humano de muita capacidade. A minha vontade é que ela ocupe o espaço dela, conquiste profissionalmente sem deixar de ser mulher. Eu luto pelos seus valores independentemente dela ser esposa, mãe, filha; pelo valor que ela tem dentro da sociedade. Seu corpo conta muita mais a história, pelas rugas, pela textura da pele há mais sinceridade, ao passo que o homem é mais egoísta, esconde, não fala com seu corpo o que viveu. Na minha outra exposição fiz mulheres e quadrados, e esse quadrado significava o espaço que ela estava conquistando. Hoje defino mais ela, e seu espaço.

IZZA – Desde o início você sempre usou somente este tema?

CLAUDIA – Não, já pintei paisagens, mas não tinha nada definido em minha cabeça. Depois comecei a prestar atenção naquilo que mais se salientava do inconsciente. Sempre o meu trabalho foi muito limpo e teve linha e cheguei à conclusão de que esses dois pontos eram os melhores para mim. Então soube que esse era o caminho. Aperfeiçoei o que eu tinha de melhor, mas eu sempre fiz um trabalho paralelo contrário, à gravura por exemplo em metal, que sempre é cheia de linha, completamente diferentes. Desenvolvo também um trabalho que eu não mostro aqui, no atelier da Uiara Bartira. No que faço o que tem que falar mais alto é a expressão da mulher, a mensagem que ela tem para passar. Não posso usar mais cores, e veja bem, pode-se fazer milagres com a cor.

IZZA – Você está no Dicionário dos Artistas brasileiros, não é?

CLAUDIA – Eu fiz aquela individual na Bico de Pena, bem. Cada galeria indicou três artistas que mais venderam. Como a Helena vendeu muito bem os meus trabalhos fui indicada e entrei no livro, que tem todas as referências dos artistas do Brasil.

IZZA – Existe união entre os artistas plásticos?

CLAUDIA – Para mim, com os artistas que conheço, me dou muito bem. Sempre estamos conversando e trocando idéias. E necessário conhecer não somente os artistas, mas também seus trabalhos. A arte é um reflexo de uma sociedade, de um sentimento. A arte é universal e para mim é uma coisa muito forte.

IZZA – É difícil estar sempre atualizada em termos de arte?

CLAUDIA – Creio que aqui em Curitiba é difícil porque não temos muito acesso às coisas que acontecem lá fora, mas sempre tento pedir revistas, folhetos de fora. Isto-ajuda a crescer.

IZZA – Você optou pela pintura definitivamente em sua vida?

CLAUDIA – Para mim a pintura é uma vontade muito grande em mim, e é uma coisa que eu sei que vai continuar. Adoro viver, observar, conversar com as pessoas independente de classe social e vi que a pintura é a minha maneira de sempre continuar viva porque um corpo é apenas um corpo, mas a cabeça não pode envelhecer, deixar de estar atualizada. Leio muito porque acho que no tocante à arte, tenho que estar por dentro de tudo o que está acontecendo.

IZZA – A que você atribui seu sucesso tão rápido?

CLAUDIA – Eu acho que estava faltando no mercado de Curitiba um trabalho novo. Me lembro que quando me formei, 40 pessoas se formavam e dessas que se formavam nenhuma continuou pintando e não é por falta de talento, porque muitas pintavam e desenhavam maravilhosamente bem. Então eu acho que, além daqueles artistas que já têm o seu lugar, as pessoas gostam que apareça uma coisa nova e boa. Uma obra não tem preço, e no princípio para mim era difícil saber o valor de um trabalho meu, inclusive isso fazia com que eu me sentisse mal. Aí comecei a entender o porquê de as pessoas comprarem quadros. Umas por investimento, outras pelo nome do artista, algumas para combinar com o sofá. Foi importante para mim me conscientizar disso, e separar muito bem porque levo a sério o que faço. Trabalho muito com o maior empenho, por isso acho que, se temos sucesso, é apenas uma consequência do que batalhamos.

IZZA – Vejo que a tinta que você usa é diferente.

CLAUDIA – Acho que o curitibano está mais acostumado a comprar paisagem a óleo ou natureza morta a óleo, e eu de repente comecei a pintar com tinta latex de pintura de parede e as pessoas não conseguiam entender. Hoje pinto em acrílico. Eu mesmo preparo a tela, o caixilho e sou muito preocupada com os detalhes. O meu caixilho é de cerejeira secado três anos. O tecido é o melhor que há. Uso a gelatina importada e a resina é da África. É bem complicado o processo, desde que inicio a tela, até chegar à galeria porque faço tudo aqui e as telas são super laváveis.

IZZA – Você está expondo vinte e seis quadros atualmente na Acaiaca. Porque a diferença de cor em cada sala?

CLAUDIA – Escolhi as três estações de Vivaldi; Primavera, Outono e Inverno. Todas as mulheres do Inverno são em fundo cinza com a pintura em vermelho, as de Outono são em marfim e telha a Primavera rosa e preto. Todas elas têm nome e seguem as características da estação. Em pintura sou só eu, mas na escultura temo Francalatti, porque nossos trabalhos se combinam e somos da mesma fase. A exposição vai até o dia 12 de dezembro.

IZZA – Ter suas telas expostas te sensibiliza-o e gratifica-a, não é?

CLAUDIA – Nos últimos quinze dias antes da exposição, eu não pinto mais nada porque trabalho mais na propaganda. Quando fazemos uma exposição acho que a gente se expõe, pois estou nas minhas telas e quando as pessoas chegam lá estou eu, super aberta. Ali, é lógico, meu trabalho não agrada a todo o mundo. Isso é normal, cada um é um e tem seu gosto. Sou supersensível. É importante a sensibilidade das pessoas de gostarem ou não de um trabalho. Não é importante estudar dez anos a história da arte para dizer se gosta ou não gosta. Se alguém de fora que não saiba nem ler e escrever disser que não gosta porque o meu trabalho provocou uma certa reação nele, isso é importante. Não é que eu não me importe com as opiniões, eu me importo bastante com algumas, mas estou mais segura. É impossível agradar a todos.

IZZA – Havendo tantas cores porque você optou por essas?

CLAUDIA – São cores que eu senti que representam melhor cada estação. Você me pergunta; Como você vê o inverno cinza e vermelho? Mas para mim vejo o inverno desse jeito. Só falta chover e nevar em cima do quadro. O Outono vejo exatamente marfim e telha e a primavera (todos os quadros têm nome de flor), são rosa e preto. No meu ponto de vista foram as melhores cores para representar as estações no momento. Foge do convencional. É quase que o oposto.

IZZA – Quais seriam seus planos futuros?

CLAUDIA – Eu tenho muitos planos. Eu quero ir para fora do mercado de Curitiba, só que eu sentirei a hora de fazê-lo. Atualmente estou fazendo um trabalho de escultura. Planejei ir para São Paulo, Rio e fora do Brasil. Não me importo com as consequências, mas quero levar o meu trabalho para todos os lugares que desejar. Sei que isso vai acontecendo e eu vou sentindo porque no meu trabalho eu busco que isso aconteça. Sou perfeccionista e me dedico sabendo que as coisas vão acontecer na hora certa.

IZZA – Se fosse para você comprar um quadro de outro artista quais seriam tuas preferências?

CLAUDIA – Adoro o Maia, o Lipmann, o Zimermann, o desenho de Picasso e muitos outros que não me recordo no momento. Gosto de todos os gêneros, mas o que mais admiro é a maneira mais pura, mais peculiar de cada um, de representar aquilo que ele pinta.

IZZA — Você acha que ultimamente está havendo um acúmulo de pessoas querendo ocupar o seu espaço no campo das artes?

CLAUDIA – Acho, e sinto que aconteceu isso porque o gestual apareceu e o povo começou a confundir e não é fácil de entender. As pessoas começavam somente a misturar um monte de tintas e dizer que era uma obra de arte. Claro que uma tela pintada de preto com um botijão de gás em cima, não é uma obra de arte. O povo está confundindo os valores. Você pode fazer o que tem vontade, mas até para deformar uma figura, você tem que saber desenhar esta figura e para fazer um abstrato você tem que ter um trabalho inteirinho atrás desse abstrato. Uma tela branca com um ponto preto não é uma obra de arte porque isso não se sustenta muito tempo.

IZZA – O artista sempre tem um temperamento especial, como é o seu?

CLAUDIA – Sou extremamente sensível, e aqui no trabalho não consigo falar com ninguém. Acho que a convivência com o artista é muito difícil. Nossa natureza é egoísta e, às vezes precisamos desenhar. É uma coisa muito forte. Às vezes fico um bom tempo sem trabalhar e de repente parece que a força me impulsiona e eu tenho que voltar.

 

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