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“Estou eternamente apaixonada” revela Marcia Fatuch Pinho

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Curitiba, 15 de Julho de 1990

 

MARCIA FATUCH PINHO; personalidade forte, marcante e ao mesmo tempo romântica. Confessa ser também nostálgica. Adora a vida e os momentos que ela oferece é considera-se privilegiada. Esta é Marcia, Sra. Dr. Renato Valmassoni Pinho.

 

Izza – Como vai a agitação da vida?

Marcia – Acho que na vida a gente faz opções. Nasci para ser mãe, dona de casa. Desenvolvi também este gosto depois de casada, pois moramos três anos nos Estados Unidos e você sabe que lá não existe empregada e, quando existe, está acima das possibilidades de um casal recém-casado. Então praticamente acabei desenvolvendo o gosto pelas coisas de casa, o que faz parte também da minha maneira de ser. Adoro cozinhar esporadicamente, receber. amigos, trabalhos manuais, decoração, talvez tudo isso venha da raça árabe pelo lado paterno. Me dedico muito a minhas 3 filhas e creio que é o que me toma mais tempo. Admiro e aprecio as pessoas que trabalham fora e não descarto a possibilidade de algum dia vir a trabalhar. Sei que se chegar a decidir por algum trabalho, certamente será relacionado às coisas de casa, talvez decoração, etc.

lzza – Foi marcante para você este período nos Estados Unidos?

Marcia – Foi uma ótima experiência de vida. Penso que qualquer casal que tenha oportunidade deve aproveitar, pois possibilita o crescimento, amadurecimento e fortalece a união do casal. Isso eu pude constatar quando nasceram minhas filhas e muito mais quando nasceu a última Mariazinha, que hoje tem 13 anos.

Izza – Por que foi marcante o nascimento de Maria?

Marcia – Quando ela nasceu eu tinha 26 anos. Nós de outra geração, fomos criadas diferente das moças de hoje, acho que amadurecíamos mais tarde. Atualmente uma mulher de 25 anos já é adulta, antigamente éramos criadas somente para o lar, nossos conhecimentos eram limitados. Eu tinha a Alessandra e a Giovana e chegou a Maria, portanto a Síndrome de Down. Assim como no momento foi motivo de surpresa e choque, por outro lado foi o fato mais forte e marcante de minha vida, responsável pelo meu amadurecimento e crescimento como pessoa. Para o meu marido também, pois a partir desta hora passamos a ser uma pessoa só. Naquele momento avançamos 15 anos, é difícil explicar, parece que o mundo foge aos nossos pés, mas de repente existe uma força maior que nos impulsiona a levantar. Eu, pessoalmente, sei que nesta ocasião duas pessoas foram as maiores responsáveis por esta força. Uma delas é a minha mãe, uma pessoa que admiro muito. Sua sabedoria de vida é enorme, sabe encarar com “garra” os problemas e viver a vida como deve ser vivida. Nunca poderei esquecer a frase que ela me disse, palavras que poucas filhas talvez tenham a oportunidade de ouvir de uma mãe: “não são todas as famílias que possuem o privilégio de receber um anjo em casa”. Isso até hoje me emociona e cada vez mais aumenta a minha admiração por ela. A segunda pessoa, sem dúvida, foi meu marido porque ele sofreu tanto quanto eu, foi e é o peso forte de minha balança. Sou eternamente apaixonada e até hoje não me envergonho de dizer que sou uma mulher dependente.

lzza – O que esta experiência provocou em sua vida?

Marcia – Hoje ela é o centro de nossas vidas. É uma menina de um carinho único. Fortaleceu a família, mudou nossos valores, nos fez saber que o outro lado existe. Quando me refiro a família, quero dizer a nossa, a minha, a do Renato e os nossos amigos. Ela é tão amada que quando escolhemos o seu nome “Maria” foi para pedirmos forças e proteção a Nossa Senhora e acho que conseguimos, pois graças à ajuda de pessoas maravilhosas nesse trabalho feito durante 10 anos seguidos, continuamos a nossa escalada. Também a reação de Alessandra, hoje com 17 anos e de Giovana (15 anos), foi surpreendente, essencial para completarmos este trabalho. Extremamente sensíveis, elas têm verdadeira paixão pela irmã e tenho certeza que esta sensibilidade que elas desenvolveram nestes anos será muito válida para o futuro. Este amor profundo que nutrem pela irmã, me faz considerá-las as melhores filhas do mundo. Mariazinha é bem desenvolvida, é especial. Hoje ela frequenta’ uma escola especializada muito boa e nos surpreende cada vez mais.

Izza – O que te gratifica como pessoa?

Marcia – Nestes 13 anos nos propusemos a ajudar todas as pessoas que têm uma criança com Síndrome de Down, já pudemos realizar um trabalho e continuamos realizando. Simplesmente as pessoas nos procuram, vêm até aqui em casa, conversamos, etc. Se necessário, passamos todas as experiências e informações. Isso dá força por que eles vejam a mesma menina e se animem a enfrentar o fato, que deve ser encarado “de frente” com muito amor. Nunca escondi, porque isso me dá oportunidade de ajudar de alguma forma os que passam pelo mesmo problema. A maior emoção que tive foi quando em 1981 – Ano Internacional do Deficiente – fui representar o Clube Curitibano através do convite de Terezinha Abage, como “Mãe Excepcional do Ano”, Foi importante porque ali eu consegui com muita emoção, transmitir alguma coisa que estava dentro de mim, falar para 300 pessoas, e cheguei à conclusão de que tínhamos sido escolhidos – Deus te escolhe! A vida é um todo, a gente vai unindo as coisas e tira a essência. Você opta por ser feliz ou não ser. Se você quer ser feliz vai em frente e encontra a felicidade. Eram diversas entidades de Clubes, com o mesmo problema. Foi superinteressante e inesquecível.

lzza – Você falou que gosta de ser dependente. Por que?

Marcia – Em todos os sentidos. Sou extrovertida por natureza mas gosto de ser dependente, porque sou feliz, realizada. Então esta minha dependência é relativa, porque eu sei que poderia fazer o que quisesse mas, ao mesmo tempo, a maneira pela qual sou tratada me faz muito bem. Sou muito romântica.

lzza – Por que você se considera privilegiada?

Marcia – Casei com o amor de meus treze anos. Tive oportunidade de morar fora do país, de adquirir novos conhecimentos. Temos um grupo de amigos enorme, uma família maravilhosa. Você passa por alguma provação olha para trás e não faz força para superar aquela dificuldade, então você não merece ter tido tudo aquilo, porque são poucas as pessoas privilegiadas. O privilégio não é você ter as coisas e sim conseguir ter. Você não consegue nada sem luta. Nem sempre tudo acontece como as pessoas desejam. Não aprecio perdedores. Por isso, por ser uma lutadora me considero privilegiada.

lzza – Qual seria a sua filosofia de vida?

Marcia – Viver intensamente cada momento de todas as formas e, se puder, marcá-los através de um registro com fotografias. A vida passa muito rápido e é um círculo onde as coisas vão acontecendo sempre de forma diferente. De repente você pode não estar mais com aquelas pessoas que gostaria e por isso gosto de fotografar tudo. Reconheço que sou nostálgica, gosto de lembrar o passado, de coisas antigas, mas não tenho na fotografia um “hobby”. Sou fotógrafa de” fundo-de-quintal”, como dizem. Guardo álbuns e álbuns e adoro vê-los e revê-los para relembrar momentos. 

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