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“Me apaixono por tudo que faço” fala Carmen Zanchi

Postado em

Curitiba, 3 de março de 1990

 

CARMEN ZANCHI; artista plástica de projeção, advogada, técnica contábil, começou a pintar em 1969. Participou de inúmeros Salões, coletivas e individuais. Em 1987 recebeu o lº prêmio no Salão de artes plásticas de Santo André (SP); Menção Honrosa no Estúdio Lu Gonçalo em La Paz, Bolívia; em 1968 medalha de ouro do “Retrospectivas” em São Paulo.-medalha de bronze no IX Salão Feminino de Artes Plásticas; Menção honrosa no Salão ”Abolição” (São Paulo); medalha de bronze no Salão Paisagem e Casarios, São Paulo, medalha de ouro no Salão Ela (São Paulo); medalha de prata no Salão Visão Nordeste, São Paulo; em 1989 diploma de honra ao mérito e cartão de prata em São Paulo no III Concurso Nacional de obras premiadas como “Hors Concurs”.

 

lzza – Quando você começou a pintar?

Carmen – Eu comecei a pintar no ingênuo primitivo em 1969, como auto-didata. Depois, passei a frequentar aulas particulares com artistas plásticos. Muitas pessoas viam minhas telas em minha casa e se animavam a participar de eventos. Na época eu achava que não possuía ainda estilo próprio porque eu pintava gêneros diferentes. Em 1986 eu comecei a ter uma linha de conduta; foi quando eu desisti das aulas porque cheguei a conclusão que, normalmente, embora sejam excelentes mestres da pintura, os professores tentam colocar na cabeça do aluno sua própria linha. Para mim isso não satisfazia, porque eu não queria nada dos outros e sim conseguir algum resultado meu. Como te falei, em 1966, comecei a ter a minha pró¬pria linha dentro do figurativo, pessoas, objetos e coisas. O trabalho ficou homogêneo por que da primeira à décima quinta tela poderia se observar que a mesma pessoa havia pintado.

lzza – Quando você começou a pintar pensou em fazer disso um meio de vida?

Carmen – Não. Nem agora eu vejo como um negócio. Inclusive, quando me perguntam porque eu pinto, eu respondo que eu advogo para sobreviver embora eu ame muito minha profissão e pinto para existir. Se eu não pintasse me faltaria um pedaço, faz parte de mim, da minha vida. Veja, se nessa exposição “A Fantasia Alada” que vou fazer na Nini Barontini, não comprarem nada e só acharem bonito, já estou realizada.

Izza – E a Advocacia?

Carmen – Me apaixono por tudo que faço e me apaixonei pela advocacia. Eu não conseguiria viver sem a minha profissão. Tenho que ir todos os dias ao escritório. Até nos feriados vou até lá para arrumar, organizar, sempre há algo a fazer. Mesmo que eu não ganhasse um centavo como advogada, me contentaria em poder resolver os problemas dos outros. Sem a pintura, também, eu não seria completa. Uma coisa complementa a outra. Minha função de advogada eu tenho que cumprir porque acho que para ser boa em minha profissão, tenho que ser artista, senão muitas vezes, não conseguiria encontrar soluções para as questões legais, pois a justiça é muito morosa. O fato de eu lidar com pessoas, conviver com os seus problemas e resoluções, engrandece minha arte.

Izza – A crítica é importante na vida de um artista?

Carmen – Acho importantíssima e tem que existir, desde que seja uma crítica especializada, de gabarito. Já vi salões que contaram com críticos que nada tinham a ver com a arte, cantores, fabricantes de algum produto. Eu realmente acho que para analisarmos uma pessoa devemos conviver com ela. A crítica é essencial porque nos faz analisar melhor nosso trabalho, desde que seja construtiva. É um incentivo. O ano de 87 foi o ano que mais participei de salões. Sabe por que? Porque eu analisei (por motivo do corte em 86) e aprimorei a minha forma de trabalhar.

lzza – Por que existem poucos críticos aqui?

Carmen – Acho que deveria ter mais. Os que pouco que se dedicam a essa função, são bastante acessíveis. Sinto que são sinceros, puros e leais. A pessoa que não aceita a crítica está perdendo tempo. Tenho ouvido críticas e veja bem: tudo o que ouço acrescenta alguma coisa em meu caminho.

lzza – Por que os artistas dificilmente se consideram totalmente realizados?

Carmen – Não sei. Acho que a gente está sempre buscando algo. Veja, eu agora estou com um imenso desejo de pintar todos os pássaros do mundo. Me baseio na realidade, mas logo em seguida vem aquela dose de fantasia. A gente quer sempre mais e mais e por isso, nunca nos consideramos realmente prontos.

Izza – Para pintar estes pássaros você se baseia somente na imaginação?

Carmen – Eu peço emprestado os passarinhos em gaiolas porque, coincidentemente, ao lado de minha casa existe um aviário. Por outro lado, alguns já estão quase prontos em minha mente mas às vezes, não vejo sua sombra, a forma como se movimentam, o modo de abrir as asas, etc., então, o melhor é pegar um pássaro real, não importando o tipo.

Izza – Em sua evolução como artista, o que mais lhe marcou?

Carmen – Observei que eu era uma pessoa muito fechada, muito profissional, atendia as pessoas formalmente e era incapaz de dar um sorriso ou vestir uma roupa mais suave, mais leve. Geralmente me vestia com roupas pretas, eu fazia caramujos fechados, solitários, em paisagens devassas; depois eles começaram-a se abrir, as paisagens começaram a dar lugar ao céu. Aconteceu a abertura e, dentro da pintura, eu me transformei em outra pessoa, mais alegre, extrovertida.

Izza – Qual é a sua técnica?

Carmen – Não uso nem lápis nem carvão. Uso diretamente pincel e tinta. Não faço desenho preliminar, o meu esboço já é com a cor. Sempre pintei a óleo, sobre papel, tela sobre eucatex, etc. Já tentei desenho, mas não deu certo. Me atrapalho com lápis, borracha e papel. Com pincel e tinta tudo dá certo, faço o desenho que eu quiser.

Izza – Quais foram os temas predominantes em suas diversas fases?

Carmen – A primeira foi a fase de pesquisa. Em seguida eu fazia só Cristo, depois vieram as flores mas, como eu não tinha a flor em minha cabeça, tinha que tê-la em minha frente. É incrível como cada tela tem a sua estória. Depois vieram os caramujos e pérolas e, na sequência surgiram os pássaros, esta sequência não é programada, ela surge sozinha.

Izza – Qual é a característica de sua fase atual?

Carmen – Ela está entre real e imaginário. São pássaros que mudam e são fantasiosos. Quanto às cores, há a predominância da cor salmão, do azul, do verde. Acho que, depois que comecei a pintar os pássaros, consegui ver as pessoas mais nitidamente. Antes, eu só enxergava seus problemas e os meus. Agora eu vejo você como urna pessoa feliz, mesmo que não seja, mas sua aparência me transmite felicidade interior. Você tem o que transmitir. Depois que os meus pássaros começaram a voar, comecei ver as pessoas de cima para baixo e não de baixo para cima – o mundo ficou bem mais bonito. Todas as pessoas têm defeitos, a arte é podermos ver o lado bom que às vezes, é bem melhor do que o meu. Realmente acordei para o mundo! O ser humano é capaz de transmitir coisas lindas.

Izza – O que é gratificante para um artista?

Carmen – Em 1988 tive várias premiações que muito me surpreenderam, em 1989 tive um prazer inesperado. Selecionei algumas telas para concorrer ao 3º Concurso de Obras Premiadas em São Paulo, no Maksoud Plaza. Fiquei surpresa quando soube que o júri concluiu que eu não precisava passar por seleção. Recebi o diploma de Honra ao Mérito, um cartão de prata e fui considerada Hors Concours. Fiquei felicíssima!

 

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